05/12/2025
Não é raro ouvir professor comentar: “quero me aposentar e continuar em dois cargos, pra ficar com três rendas”. A ideia é tentadora, mas o Direito Constitucional e a jurisprudência do STF colocam limites bem claros nessa vontade.
A regra geral da Constituição é proibir a acumulação remunerada de cargos, empregos e funções públicas, admitindo apenas exceções muito específicas, como:
dois cargos de professor;
um cargo de professor com outro técnico ou científico;
dois cargos privativos de profissionais da saúde, com profissões regulamentadas.
Ou seja: a “porta de entrada” da acumulação é estreita. E quando falamos em três fontes de renda públicas ao mesmo tempo, a situação fica ainda mais restrita.
Tripla acumulação é quando a mesma pessoa recebe, ao mesmo tempo, três remunerações relacionadas ao poder público, por exemplo:
proventos de uma aposentadoria de professor + dois vencimentos de cargos de professor em atividade; ou
duas aposentadorias de cargos de professor + um vencimento em cargo ativo; ou
dois cargos em atividade + uma pensão ou provento.
Aqui entra o ponto central: o STF já enfrentou esse tema e firmou tese com repercussão geral (Tema 921), exatamente sobre hipóteses de servidor professor que recebia aposentadoria + dois vencimentos em cargos acumuláveis.
A tese fixada foi:
“É vedada a cumulação tríplice de vencimentos e/ou proventos, ainda que a investidura nos cargos públicos tenha ocorrido anteriormente à EC 20/1998.”
Traduzindo: o STF fechou a porta para a regra geral de três remunerações simultâneas oriundas de cargos públicos, mesmo que o servidor tenha ingressado em todos eles antes da reforma de 1998.
Aqui entra a pergunta que interessa ao professor:
“Se a Constituição permite dois cargos de professor, e eu já sou aposentado, não seria possível ficar com os dois cargos e a aposentadoria?”
A resposta honesta é: na maioria dos casos, NÃO. É mito achar que a tripla acumulação é automaticamente permitida.
Em termos de servidor estatutário (regimes próprios – RPPS), a interpretação predominante é:
Dois cargos de professor em atividade + uma aposentadoria de professor (ou de outro cargo público)
– Esbarra diretamente na tese do Tema 921 do STF, que veda a tripla acumulação de vencimentos e/ou proventos.
Duas aposentadorias de cargos acumuláveis + um cargo ativo
– Segue a mesma lógica: três fontes remuneratórias ligadas a cargos públicos, em regra, violam o art. 37, XVI e §10 da CF/88.
A jurisprudência e notas técnicas (MTP, CGU, TCU) vêm reforçando o entendimento de que a exceção constitucional permite, no máximo, a dupla acumulação, não uma terceira posição remunerada permanente.
Há, porém, cenários mais complexos, por exemplo:
Professor aposentado pelo INSS (RGPS) + dois cargos públicos de professor (RPPS);
Duas aposentadorias de cargos acumuláveis + pensão por morte;
Combinações envolvendo regimes distintos (RGPS x RPPS) e momentos diferentes de concessão.
Nesses casos, a discussão passa por pontos como:
se o benefício de aposentadoria é previdenciário comum (art. 201, RGPS) ou provento de servidor (art. 40, RPPS);
se a vedação do art. 37, §10, e a tese do Tema 921 alcançam aquele tipo específico de renda;
se a acumulação deriva de situações juridicamente independentes, como duas aposentadorias de cargos acumuláveis mais uma pensão que não se originou de “novo cargo” assumido pelo próprio servidor.
O próprio STF já reconheceu, por outro lado, que é possível receber duas aposentadorias de cargos acumuláveis (por exemplo, dois cargos de médico ou dois cargos de professor), desde que a acumulação fosse lícita na atividade.
Ou seja, dupla acumulação (dois cargos / duas aposentadorias de cargos acumuláveis) é uma realidade jurídica; o grande problema é querer adicionar uma terceira remuneração em cima disso.
👉 É professor e já acumula cargos ou pensa em se aposentar mantendo dois vínculos?
Antes de tomar qualquer decisão, vale fazer um Planejamento Previdenciário específico para professores, analisando cada vínculo, regime (INSS/RPPS) e data de ingresso. Um erro aqui pode significar corte de remuneração, devolução de valores e até responsabilização.
Mesmo quando a acumulação é lícita (por exemplo, dois cargos de professor), ainda existe o teto remuneratório.
O STF já decidiu, em casos de acumulação, sobre a aplicação do teto quando há mais de um vínculo, discutindo se o limite incide sobre cada remuneração isoladamente ou sobre o somatório, havendo entendimento de que a soma não pode ultrapassar o teto constitucional, ainda que os cargos sejam acumuláveis.
Para o professor isso significa:
Não basta a acumulação ser permitida;
É preciso também verificar se a soma final não viola o teto (teto federal, estadual ou municipal, conforme o ente).
Insistir em “três rendas” no serviço público pode gerar consequências bem concretas, como:
suspensão de uma das aposentadorias ou cargos, por decisão administrativa ou de controle externo (Tribunais de Contas);
exigência de devolução de valores recebidos em situação considerada inconstitucional;
discussão judicial longa e desgastante, normalmente com decisões alinhadas à tese do Tema 921, que é vinculante.
Em outras palavras, apostar em tripla acumulação como “estratégia financeira” é, hoje, mais um risco do que uma oportunidade.
Para o professor, a conclusão prática é:
Dois cargos de professor (ou professor + técnico/científico) – possível, se houver compatibilidade de horários e observância do teto.
Duas aposentadorias oriundas de cargos acumuláveis – possível, em hipóteses já admitidas pelo STF, respeitado o teto.
Tripla acumulação (dois cargos + uma aposentadoria; duas aposentadorias + um cargo; ou outras combinações com três fontes permanentes) – em regra, vedada pelo Tema 921 do STF e por notas técnicas de controle interno e externo.
Portanto, para a maioria dos professores, “dois cargos de professor + uma aposentadoria” é mais mito do que realidade jurídica. Existem situações específicas que merecem estudo fino (especialmente quando envolve INSS x RPPS, pensões e datas antigas), mas a regra de segurança é: planejar antes, não tentar “empurrar” a tripla acumulação depois.
📲 É professor e quer saber se a sua acumulação é regular ou se corre risco de corte de renda?
Procure um advogado especializado em Direito Previdenciário dos Professores para analisar seus vínculos, aposentadorias e pensões à luz do Tema 921 do STF. Uma consulta preventiva pode evitar anos de dor de cabeça, cortes inesperados e cobranças de devolução de valores.